quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Texto do Trabalho Fotográfico

Apesar do incessante movimento no solo, não se engane, ele é apenas transitório. A cidade de São Paulo funciona mesmo nas alturas.
As pessoas ali vivem: moram, trabalham, planejam, tomam decisões e ironicamente projetam outros prédios. É dentro de prédios que nascem outros prédios, como num círculo vicioso, o que provoca uma sobreposição desses imensos blocos de concreto. Não há espaço para deixar espaço entre eles, de forma que eles quase se confudem, mal se distinguem.
Olhando de cima, as pessoas lá embaixo são iguais, como vultos. A distância física traz com ela a impessoalidade.
Olhando de baixo, há uma sensação de sufocamento, como se a cidade quisesse te consumir porque não é possível saber a real dimensão daqueles arranha-céus, nem sequer ver onde terminam.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Narração Publicitária

Pedro era um jovem comum: fazia faculdade, gostava de natação e saía à noite com os amigos. Foi numa dessas saídas que aceitou um cigarro. Não acreditava que aquele ato poderia mudar a sua vida. Os anos seguintes comprovaram isso, ele continuou vivendo bem, formou-se, casou-se e realizou o sonho de ser pai, duas vezes.
Numa tarde ensolarada resolveu ensinar seus filhos, já crescidos, a andar de bicicleta. Haviam andado apenas meia quadra quando Pedro sentiu-se sufocado. Arfando, com a mão no peito, voltou para casa com as crianças. Ainda era novo, não sabia justificar o mal-estar. Acendeu um cigarro e as crianças se afastaram. Também não via o motivo do afastamento da família. Então se deu conta da realidade da qual era refém. O cigarro havia, finalmente, mudado sua vida. A partir desse dia, travou uma batalha durante meses contra o tabagismo.
Sua recompensa veio em forma de aproximação da mulher e filhos, de novos sabores, seu folêgo restituído, a redescoberta de prazeres que ele mal lembrava que existiam.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Bilhete

Ele acordou sozinho, há tempos o despertador não se fazia mais necessário. Não havia horários, nem agenda em sua vida, era tudo sempre o mesmo naquela cidadezinha pequena e pacata. Acordou nem sabia porque, e também sem motivo vestiu-se e arrumou a casa, coisa que não exigia muito esforço. Um dia aquela casa fora alegre, decorada não apenas com móveis bonitos, mas também com objetos interessantes, vindos de outros países, lembranças de viagens exóticas e experiências muito ricas. Hoje, ela era apenas silenciosa e cinza, sem mais nenhum sinal de que um dia ali viveu um aventureiro.
Terminada essa tarefa, o homem abriu a porta de casa e saiu. Ao passar pela caixa de correspondência, pegou a única carta que lá se encontrava e colocou-a no bolso, sem interesse em saber de quem era ou o que continha.
Resolveu ir até uma praça, onde acendeu um cigarro e ficou contemplando o movimento das pessoas, pensando como estava farto dessa vida que nada mais lhe proporcionava. Uma vez tendo vivido tudo o que viveu, ele agora achava difícil encontrar outras motivações, ainda mais com a falta da esposa, aquela que tinha sido sua companheira em tudo. 
Antes que pudesse prosseguir com pensamentos sobre ela, lembrou-se da carta e tirou-a do bolso devagar. Deu uma bela olhada e percebeu que não  havia remetente. "Talvez seja uma daquelas propagandas", pensou descrente. Ledo engano. Havia um pequeno pedaço de papel ali, e nele uma única frase, que dizia: Hoje, espere que todos que encontrar tenham uma mensagem pra você.
Alguma coisa naquele homem se acendeu. Talvez uma mensagem fosse exatamente o que ele precisava. Levantou-se  subitamente e começou a andar pela cidade, procurando conhecidos que pudessem lhe revelar que mensagem seria aquele. Não desanimou nem mesmo quando não encontrou nenhum rosto familiar, começou a conversar com desconhecidos. Velhinhas descansando na frente de suas casas, jornaleiros, crianças nos balanços, mulheres nos cafés, engraxates das ruas, todos conversaram com ele. E o homem bebia de suas palavras, procurando atenciosamente pela mensagem em cada frase proferida. Ouviu sobre variados assuntos, conheceu um pouco de cada um, criou amizades. Ao final do dia, quase esqueceu de seu objetivo, sentiu-se leve e até contente, mas não havia descoberto sua mensagem. Nada do que os outros disseram parecia ter algum significado especial. 
Até que uma idéia lhe ocorreu. Suspirou e soltou os ombros, aliviado. Sorriu sozinho e entendeu que a mensagem não estava no que as pessoas diziam, mas estava nelas mesmas.




sexta-feira, 25 de setembro de 2009